Homilia do Cardeal Patriarca de Lisboa na Solenidade de Santa Maria Mãe de Deus, Dia Mundial da Paz


O Santo Padre desafia a Europa a interrogar-se se a paz que conseguiu manter é a paz perfeita ou se não há um longo caminho, nunca completamente percorrido, para a edificação de uma paz verdadeira, em que os Povos, como membros de uma grande família, sintam a grandeza da dignidade da pessoa, onde a  experiência comunitária levará à experiência do amor e da comunhão.

“Em cada pessoa – diz o Papa – o desejo de paz é uma aspiração essencial e coincide, de certo modo, com o anseio por uma vida humana plena, feliz e bem sucedida. Por outras palavras, o desejo de paz corresponde a um princípio moral fundamental, ou seja, ao dever-direito de um desenvolvimento integral, social, comunitário, que faz parte dos desígnios de Deus para o homem”. A busca da paz coincide, assim, com a luta pela realização da plenitude humana, é um caminho que supõe uma verdadeira mística da paz, enraizada na cultura e concretizada nas opções práticas para a vida das comunidades humanas. A generosidade pessoal, a organização da sociedade, as estruturas políticas e económicas precisam de ser mobilizadas por essa mística da paz.

Há 50 anos o Concílio Vaticano II lembrava: “A paz não é só a ausência de guerra e não se limita a procurar o equilíbrio entre forças contrárias… ela é «obra de justiça», lembrando que “a paz não é realidade adquirida uma vez por todas, mas algo a construir sem cessar»”.

Citando João XXIII, o atual Papa recorda: “A paz implica principalmente a construção de uma convivência humana baseada na verdade, na liberdade, no amor e na justiça”. Faz parte da verdade profunda do homem, encontrar a sua realização na comunhão com os outros homens. A paz é, assim, vitória sobre o individualismo e os egoísmos, busca, antes de mais, o bem-comum de toda a comunidade. Bento XVI é claro: “A ética da paz é uma ética de comunhão e de partilha. Por isso é indispensável que as várias culturas de hoje superem antropologias e éticas fundadas sobre motivos teórico-práticos meramente subjetivistas e pragmáticos, em virtude dos quais as relações da convivência se inspiram em critérios de poder ou de lucro, os meios tornam-se fins e vice-versa, a cultura e a educação concentram-se apenas nos instrumentos, na técnica e na eficiência”.

O Santo Padre recorda-o: “Para nos tornarmos autênticos obreiros da paz, são fundamentais a atenção à dimensão transcendente e o diálogo constante com Deus, Pai misericordioso, pelo Qual se implora a
redenção que nos foi conquistada pelo seu Filho Unigénito. Assim o homem pode vencer aquele gérmen de obscurecimento e negação da paz que é o pecado em todas as suas formas: egoísmo e violência, avidez e desejo de poder e domínio, intolerância, ódio e estruturas injustas”.

É esta certeza que nos permite acreditar, em todas as circunstâncias, que a paz é possível. Ela é a aventura do amor que nos foi comunicado pelo Espírito de Jesus. A paz … na novidade humana enraizada na Páscoa de Jesus: “A Paz é uma ordem vivificada e integrada pelo amor”, Cristo é a nossa paz. É preciso, é urgente, anunciar de novo e por caminhos novos, a importância de Jesus Cristo para o futuro da humanidade.

Se não tivermos medo de Deus e da sua intervenção na história a favor dos homens, se não nos deixarmos embriagar pela total autonomia do homem e do seu poder na construção da paz, poderemos encontrar em conjunto os verdadeiros pilares da construção da justiça e da paz.

O Santo Padre, na sua Mensagem, alerta-nos para a urgência de uma pedagogia da paz. A sua primeira expressão é cultural. Todos os agentes culturais, as universidades e as escolas, os “média”, a Igreja, devem contribuir para uma transformação cultural que promova a verdadeira paz; que supõe um novo pensamento e uma conversão ideológica.

É uma pedagogia da bondade e do perdão. “É um trabalho lento, porque supõe uma evolução espiritual, uma educação para os valores mais altos, uma visão nova da história humana. É preciso renunciar à paz falsa (…) a pedagogia da paz implica serviço, compaixão, solidariedade, coragem, perseverança”. É marcada pelo ideal de uma humanidade nova, que anuncia o Reino dos Céus.

Homilia do Cardeal Patriarca de Lisboa na Solenidade de Santa Maria Mãe de Deus, Dia Mundial da Paz

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